quarta-feira, 9 de setembro de 2009

Artigo publicado, DP, 8.9.2009

ENCANTOS E DESENCANTOS DE OLINDA
Clóvis Cavalcanti
Economista ecológico e pesquisador social

Nestes dias em que a realização da Mostra Internacional de Música em Olinda (Mimo) aumenta os encantos da cidade, a sensação de prazer não se torna mais consistente porque é visível em toda parte a deterioração urbana da primeira Capital Brasileira da Cultura. Indo-se, por exemplo, da praça do Carmo para o Alto da Sé, tem-se o desconforto de passar pelo adro do convento de São Francisco, submetido há pouco tempo a terrível desfiguração. Além disso, tanto o movimento de veículos pelo local, antes muito fluido, quanto o acesso de pessoas que vêm das ruas que desembocam em frente ao cruzeiro do convento enfrentam obstáculos perigosos. O largo do cruzeiro é obra inacabada e sem funcionalidade: medíocre. Parte do calçamento da ladeira de São Francisco, assentada sem cuidados adequados, apresenta afundamentos. Pior situação é a da avenida que vai da praça do Carmo, passando pelo Fortim, na direção das praias. Obra terminada há menos de seis meses, não resiste ao movimento de veículos, intenso ali, inclusive por ser roteiro de ônibus. Em muitos trechos, o calçamento de paralelepípedos da via está se soltando, formando ondulações pelas quais o trânsito se processa de maneira lenta; daí, aumentam os engarrafamentos no horário das 18h-20h. É incrível, na verdade, como um trabalho de muitos meses se esvai em pouquíssimo tempo: dinheiro público (mais uma vez) malbaratado. Quem pagará pelo prejuízo?
Chegando ao Alto da Sé, a pessoa que ali for terá uma triste visão de caos inconcebível. Está tudo escavado, fora de ordem: um atropelo que não parece ter fim. Enorme placa, que enfeia a praça e atrapalha a visão, informa que a obra “terminará” no dia 29.6.2009. A propósito, outra placa descomunal, no Complexo de Salgadinho, perto da ponte da Ilha do Maruim, indica que se está fazendo a requalificação do Alto da Sé, com a informação grandiloqüente: “Mais uma obra do Governo do Estado”. Aliás, o que não falta em Olinda são placas de propaganda de empreendimentos governamentais – da União, estado, município. Enquanto isso, o cenário em muitos espaços se deteriora, se empobrece. Em outros locais, como no Bonsucesso, são esgotos a céu aberto que empestam e desfiguram uma cidade tão especial como Olinda. Bem em frente à sede do Homem da Meia-Noite – agradável patrimônio olindense – escorre água imunda, de péssimo odor, pestilenta, tirando o prazer das refeições de quem mora naquelas bandas, sem contar o perigo que isso representa para a saúde pública. Ao mesmo tempo, falta água potável nas casas dos moradores da Cidade Alta. No domingo 23 de agosto, quando fui ao banheiro pela manhã, sumira a água de minha casa. Mesmo com 6 mil litros de reserva, tínhamos ficado completamente sem o liquido. Mas logo me consolei (??): na casa de Vanessa Ava, minha aluna, no Bonsucesso, a água não chegava há oito dias!Esse é o panorama de uma cidade especial – maltratada, abandonada, sem gestores. Os encantos do Mimo – que Vera Milet, minha amiga moradora do Alto da Sé, diz que dão a Olinda ares mais civilizados – convivem com mazelas injustificáveis. Se a isso se soma o desastre ecológico deixado no Parque Memorial Arcoverde, portão de acesso da cidade, pelo Cirque du Soleil, a sensação dos olindenses não pode ser outra que de desencanto e tristeza. Pior: não se tem a quem recorrer. Beneficiando-se do fato de ser amigo do presidente Lula, do governador Eduardo Campos, da ex-prefeita Luciana Santos, agora a todo-poderosa da ciência, tecnologia (e meio ambiente) em Pernambuco, o prefeito Renildo Calheiros, um não-olindense, parece ter sumido.

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