Clóvis Cavalcanti
Economista e pesquisador social
Assistindo à missa, terça-feira passada, no convento franciscano de Olinda, meu vizinho, fiquei pensando no que o celebrante falou em sua homilia. Ele chamou a atenção para certos mistérios que cercam o surto da nova gripe, chamada de suína no começo, e agora conhecida pela cepa de seu vírus (H1N1). Com razão, notou que há mais gente infectada nos EUA do que no México. Conjeturou acerca da hipótese de o surto da enfermidade estar ligado a alguma iniciativa de laboratório inescrupuloso que teria feito a combinação fatídica de vírus humanos, aviários e suínos, jogando-a na população para vender medicamento que combata o mal. Comentou ainda que a dengue está matando muito mais, no mundo todo, do que a nova gripe. E perguntou aos fiéis: “Vocês não acham que há algo estranho aí?” Certamente, há muita coisa estranha. A primeira delas é que não se vê qualquer discussão sobre as origens, a razão de ser da pandemia. Como, onde e em que momento ela surgiu? Não seria o caso de descobrir o foco e procurar evitar que ele desencadeie ameaças ainda maiores? O que se vê são apenas iniciativas para evitar a propagação do surto, cuidados recomendados para que o contágio seja o menor possível, conselhos para que as pessoas procurem socorro médico, etc. Nada contra isso, mas que explicações existem para um fenômeno do qual não se falava há menos de dois meses?
Sobre o assunto, reportagem cuidadosa do último número da revista semanal americana Newsweek (11-18 de maio) traz informações e reflexões bastante úteis. Ela chama a atenção, por exemplo, para o que denomina “estranha ecologia que criamos para alimentar de carne nossas volumosas populações humanas”. Trata-se de um mundo assustador no qual bilhões de animais são confinados em espaços minúsculos, ali mantidos apenas para comerem – e comerem muito, a fim de adquirem peso exagerado em pouco tempo. Circulam na Internet artigos com fotos horrorosas que mostram a maneira como galinhas são criadas em granjas ou gansos preparados para que seus fígados inchem e produzam muito material para os famosos patês de foie gras. Os perus da tradição norte-americana do Dia de Ação de Graças, como diz uma escritora dos EUA (Martha R. Gore), não têm nada a ver hoje com os que os peregrinos que iniciaram a tradição comiam há 200 anos. São criados em gaiolas, de modo que não se movimentem, fiquem com os pés atrofiados e peitos enormes, com carne macia. Perus criados soltos têm carne dura, pois andam muito, sobem em árvores, correm, etc. Enfim, desenvolvem seus músculos. Os de capoeira apresentam essas características, do mesmo modo que galinhas.
A situação dos porcos é terrível. Já fui a uma criação “moderna” dos bichos no estado do Rio de Janeiro e fiquei penalizado. Durante sua vida toda, o porco desse modelo de pecuária não sai de um cubículo, no qual só pode ficar voltado para uma única direção, a do cocho da comida. Ali, ele é entupido de ração e, atrás, elimina seus excrementos. Tal realidade é a de uma enorme fazenda suína, de propriedade americana, no remoto município mexicano de La Gloria. A respeito, diz Newsweek: “Essa é a ecologia que, nos casos de porcos e galinhas, está cultivando a influenza. Trata-se de uma ecologia que promove uma evolução viral”. Foi em La Gloria que o garoto Édgar Enrique Hernández, no dia 2.4.09, manifestou o que se considera como primeiro caso da nova gripe (na verdade, ela ocorreu pela primeira vez, com certeza, no dia 7.12.05, no estado de Wisconsin – EUA, produto da combinação H1N1 de vírus humano, suíno e aviário). Certamente, os porcos não têm nada com isso; nem os galináceos. Toda a culpa é da espécie humana, com sua gula, sua ganância – como bem definiu o franciscano de Olinda. Só nos resta pedir a S. Francisco que nos ajude a deixar de brincarmos de feiticeiros e a respeitar as leis pétreas da natureza.
2 comentários:
Cara Clovis,
você já faz parte dos blogs que acompanho. Parabens pela sua breve e profunda aula de hoje em Brasília.
Gonzalo Enríquez
CARO Clovis,
você já faz parte dos blogs que acompanho. Parabens pela sua breve e profunda aula de hoje em Brasília.
Gonzalo Enríquez
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