DEIXANDO A FUNDAÇÃO JOAQUIM NABUCO
segunda-feira, 20 de outubro de 2014
Livros pra que te quero!
Artigo publicado no DP, Dom 5 janeiro de 2014
DEIXANDO A FUNDAÇÃO JOAQUIM NABUCO
DEIXANDO A FUNDAÇÃO JOAQUIM NABUCO
Clóvis Cavalcanti
Economista ecológico e pesquisador social; clovis.cavalcanti@yahoo.com.br
Começo o ano em situação inusitada. Sem atividade fixa. No dia 31 de dezembro último, terminou meu mandato de chefe da Coordenação-Geral de Estudos Ambientais e da Amazônia (CGEA), parte integrante da Diretoria de Pesquisas Sociais (Dipes) da Fundação Joaquim Nabuco (FJN). É bem verdade que continuo dando aula (de Meio Ambiente e Sociedade) no Centro de Ciências Biológicas da UFPE. Porém, como professor voluntário, aposentado pela compulsória em 2010. Assim, vejo-me excluído do rol de quem labuta diariamente como membro da força de trabalho. Ainda que possa exercer diversas atividades por conta própria, o fato é que não tenho mais compromisso profissional com uma instituição. E isso é novo para mim, desde que, depois da pós-graduação, comecei a trabalhar em 1965.
Minha ligação com a FJN começou em 1966. Fui levado a seu predecessor, o Instituto Joaquim Nabuco de Pesquisas Sociais (IJNPS), por Mauro Mota que, por indicação de Roberto Cavalcanti de Albuquerque, grande economista pernambucano, me procurou para elaborar relatório de pesquisa para a Sudene (sobre o mercado de pescado do Grande Recife). Produzi esse trabalho. Logo em seguida, Mauro, por quem passei a ter grande admiração, convidou-me para escrever novo relatório de pesquisa. Era, para o DNOCS, um diagnóstico socioeconômico do Vale do Moxotó, trabalho que chamei outro grande economista pernambucano, Dirceu Pessoa (1937-1987), para dividir comigo. Tanto este quanto o relatório anterior transformaram-se em livros. Ao longo de quase 47 anos – com intervalo de 2 (1970-1972), quando fiquei em dedicação exclusiva na UFPE –, pude acompanhar a evolução e consolidação do IJNPS-FJN (não gosto da sigla Fundaj, imposta pelo governo militar em 1980 contra a que nós propúnhamos). Foi um progresso firme que se deve tanto a Mauro Mota – poeta grande e pesquisador consistente – quanto a Fernando Freyre, que conheci em 1959 no Rio, um gestor de enormes qualidades.
Fernando, ademais, sendo filho de Gilberto Freyre, criador da FJN, sabia em que terreno deveria pisar. Ele levou adiante a visão paterna, a mesma que assimilei em conversas e na convivência quase diária de duas décadas com o genial sociólogo pernambucano. Gilberto Freyre sublinhava a necessidade de se ter no Nordeste uma instituição dedicada à pesquisa social. Expôs isso inumeráveis vezes. Justificou seu projeto de lei de criação do IJNPS em 1949 à base de tal exigência. E os argumentos que usava continuam completamente válidos hoje – talvez até com mais vigor. Por isso, ao deixar a instituição com que tanto me envolvi, preocupa-me que não corresponda mais ao que imaginava seu criador. Eu próprio, tendo dirigido de 1980 a 2003 o Instituto de Pesquisas Sociais (Inpso) da FJN, como seu primeiro superintendente, fui levado a mergulhar nas idéias freyrianas e a procurar ser fiel a elas. Fernando incumbiu-me de, dentro da nova estrutura da Fundação, que sucedia a de repartição tradicional do IJNPS, não perder de vista a razão de ser do projeto de 1949. Nunca discordei dele. Pelo contrário. Como pesquisador social, hostil que era a Gilberto Freyre em 1966, pude entender o caráter visionário de sua proposta. Ele sempre me ouviu (chamava-me para conversarmos) e me fez seu aliado pelo argumento inteligente. Essa é a força histórica da FJN. Não pode ser ignorada!
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