PARA QUE SERVEM OS OUTDOORS?
Clóvis Cavalcanti
Economista e pesquisador social
Quando prefeito de São Paulo, José Serra tomou uma medida exemplar: remover os outdoors da paisagem paulistana. E não só isso. Tornou proibido fazer letreiros que desrespeitem certas dimensões. Houve gritaria, choro e ranger de dentes das empresas de propaganda. Nada adiantou. Serra manteve a decisão. O resultado é que o visual da cidade melhorou bastante. Na minha primeira ida a São Paulo depois que os cartazes tinham sido removidos, terminei encontrando alguma beleza nessa capital que não possui encantos como o Rio de Janeiro ou Olinda. O prefeito João da Costa adotou algumas providências no mesmo sentido aqui no Recife, mas nada parecido com as dos paulistanos. É incrível como as empresas de publicidade impõem o modelo do que chamam de “mídia exterior”, ocupando o cenário urbano com suas mensagens para a venda de produtos e serviços. O que, aliás, fazem também órgãos públicos para “divulgar” as maravilhas que estão – ou julgam estar – proporcionando aos cidadãos. Próximo a Moreno, na BR-232, por exemplo, há um outdoor de tamanho descomunal, do governo de Pernambuco. Até há pouco, no Alto da Sé, outro painel enorme anunciava (foi retirado) as obras que ali se arrastam.
Nesse particular, é digno de nota que até a gramática seja agredida pelos outdoors. A palavra (pronuncia-se autdórs) é inglesa? Diz o Michaelis (Dicionário Moderno da Língua Portuguesa) que sim: substantivo masculino. Porém, em inglês, outdoor é adjetivo, significando “ao ar livre”. O plural de outdoors não existe em inglês como adjetivo (não há flexão dessa função gramatical no idioma de Shakespeare). Aparece como advérbio: “lá fora”. Existe a forma, de uso raro, do substantivo outdoors, apenas no plural, a qual indica um descampado. Francamente, nenhum desses casos induz a achar inteligente a adoção da palavra outdoor no português do Brasil (em Portugal, não se usa) para significar painel de propaganda. É como também a palavra “mídia”, tão do agrado da publicidade e dos meios de comunicação. Ela veio do latim (“media”, plural de “medium”, ambas com o “e” aberto) com a pronúncia do inglês. Em Portugal, nos meios cultos e nos próprios jornais, ninguém fala mídia, mas o vocábulo latino media (com a construção “os media“, ou seja, os meios). A mesma coisa acontece nos países de língua castelhana. É triste ver uma língua neolatina como a nossa sofrer tamanha desfiguração. Credite-se isso a nosso baixo nível cultural – sem esquecer o papel da publicidade e da imprensa na perpetuação do equívoco. O historiador Frederico Pernambucano, entretanto, sempre emprega a forma “os media”.
No caso dos outdoors, há ainda um fator negativo que lhes é associado. Eles desviam a atenção dos motoristas. Às vezes, são cartazes de interesse das pessoas, com informações sobre compras, por exemplo. Você olha e vê uma multiplicidade de dados. Não consegue assimilar tudo (um telefone, digamos). Sente necessidade de olhar de novo, o que é um perigo. Na Suécia, em 1991, comentei com um amigo que me levava de carro para a Universidade de Gotemburgo, sobre a ausência de painéis de propaganda no caminho que fazíamos. Ele me disse que era proibido por lei afixar qualquer coisa nas vias públicas do país que não fossem de interesse para a orientação dos motoristas. Motivo: evitar acidentes. Vendo o informativo de dezembro de 2009 de uma agência de publicidade de Pernambuco, encontro: “Nos últimos meses, tem crescido a presença dos painéis de estrada na paisagem pernambucana, ao lado das rodovias”. Qual a necessidade disso para o bem-estar humano?
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